As bolsas de valores são um importante marco do capitalismo moderno: um espaço onde através dele se pode negociar exclusivamente ativos, opções e ações e fazer o dinheiro circular de forma livre. Mas qual é a relação da B3 com a história dos mercados financeiros brasileiros? Neste artigo exploramos a história da B3, a empresa de capital aberto de infraestrutura do mercado financeiro, que mantém a bolsa de valores brasileira, criando sistemas de negociação, compensação, liquidação, depósito e registro para todos os tipos de ativos, incluindo títulos de renda fixa, derivativos de moedas, além, é claro, das ações das empresas.
Entender como essa empresa chegou ao patamar que ocupa atualmente é entender a história dos investimentos no Brasil, além da relação dos cidadãos com o mercado financeiro. Vemos muitos gurus de investimento criticando quem utiliza a poupança dos bancos como depósito de rendas, em termos de valorização e maximização de taxas de juros. Entretanto, com um mercado financeiro tão jovem, será que estamos tão defasados em termos de conhecimento e controle das finanças, como se acredita?
Origens da bolsa de valores do Brasil
Curiosamente a história da bolsa de valores do Brasil não começou com a B3, e vem do período colonial, quando o presidente Emílio Rangel Pestana fundou a Bolsa Livre, no ano de 1890. Por causa de políticas econômicas mal sucedidas do governo de Ruy Barbosa, como a do Encilhamento, essa primeira experiência durou pouco, se encerrando em 1891, mas o marco histórico já tinha sido feito.
Nessa época e até meados dos anos 1960, os estados do país possuíam suas próprias bolsas de valores, onde transações financeiras e de ativos ocorriam. As maiores eram as do Rio de Janeiro e São Paulo, duas das principais economias da época. Essas entidades eram filiadas ao governo e regulamentadas pela secretaria de finanças de cada estado, que determinavam o funcionamento de cada pregão, até que essas entidades públicas se desvincularam e passaram a atuar como sociedades civis.
Mas vamos entender melhor como a B3 se tornou tão fundamental no mercado de capitais brasileiro.
História da B3: a trajetória da bolsa até os dias de hoje
No ano de 1895 foi criada a Bolsa de Fundos Públicos de São Paulo, seguindo a tendência de cada estado da federação e dando continuidade às trocas de títulos e ativos financeiros no país. Sua atividade permaneceu até 1935, quando a sua localização foi realocada para o Palácio do Café, no centro da cidade de São Paulo, passando a adotar o nome Bolsa de Oficial de Valores de São Paulo.
Até a década de 1960, corretores de valores eram servidores públicos, nomeados pela administração estadual, e a bolsa de cada local era administrada pelas secretarias de finanças de cada estado. Essa realidade mudou em 1965, com a desvinculação das 27 bolsas brasileiras das secretarias de finanças dos estados, passando a atuar como associações civis sem fins lucrativos, com autonomia institucional e patrimonial do governo.
Essa mudança foi um marco importante na história dos mercados de capitais do Brasil, pois concedeu maior liberdade de atuação às corretoras de valores, que eram empresas de sociedade por ações ou cotas de responsabilidade limitada. E é nesse momento que a Bolsa de Valores de São Paulo nasce.
Como a Bovespa ganhou a importância que possui hoje
Na década de 1970, com a crise econômica internacional e o regime militar no país, a Bovespa passou a ter grande destaque no cenário financeiro nacional. Antes disso, ela era menor do que a do Rio de Janeiro.
Por 30 anos, as operações da Bovespa continuaram de forma constante, até outro marco importante na história da economia nacional, quando no ano 2000, as Bolsas de Valores de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Brasília, Santos, Bahia, Pernambuco, Bolsa Regional e Espírito Santo se integraram em uma única organização de capital aberto, concentrada na Bovespa, que se tornou a entidade responsável por todas as negociações de ações do mercado de capital do Brasil, enquanto que a do Rio de Janeiro cuidaria da negociação eletrônica dos títulos públicos.
Inovações da Bovespa
Com o mercado de capitais concentrado em uma única entidade, foi possível, então, implementar uma série de inovações e modernizações na forma como as trocas de ativos eram feitas no país. A Bovespa implantou uma série de melhorias na infraestrutura de negociações:
- No ano de 2005 todas as negociações passaram a ser feitas online, de forma eletrônica, por meio da internet, extinguindo o chamado “pregão viva-voz“.
- Em 2006, a empresa implementou o pregão eletrônico doméstico, simplificando a forma como as negociações aconteciam até o momento (anteriormente com corretores fazendo negociações ao telefone).
- No ano de 2007 a Bovespa abriu o seu próprio capital, negociando ações da própria empresa.
- No ano de 2009, os contratos futuros deixaram de ser negociados por telefone, também sendo feito online.
Essas melhorias consecutivas também culminaram, em 2008, na mudança de nome da empresa para BMF&Bovespa, com a união da Bolsa de Mercadorias e Futuros com a Bovespa.
Todas as inovações em infraestrutura foram fundamentais para modernizar a forma como as negociações eram feitas no Brasil, deixando o mercado de capitais mais acessível para o público em geral e permitindo uma maior democratização de seu uso. Antes desse processo, a compra de ações era um processo caro, com custos de corretagem praticamente inacessíveis ao público em geral, mediados por bancos ou corretoras privadas, que precisavam negociar valores por telefone, acompanhando as variações em tempo real do pregão.
Com a adoção do modelo online, os custos de corretagem caíram drasticamente, permitindo o acesso a esse mercado por pessoas que anteriormente não tinham a possibilidade de participar e usufruir dessa alternativa de investimentos.
Como a Bovespa se transformou em B3
No ano de 2017, a BMF&Bovespa uniu-se à CETIP(empresa privada do mercado financeiro, chamada de Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos) e formalizou-se como B3 (Brasil, Bolsa, Balcão), alcançando a estrutura que conhecemos até o momento. A CETIP atendia cerca de 15 mil instituições financeiras como a maior depositária de títulos de renda fixa da América Latina. Era responsável pelo processamento de transferências automáticas, além de liquidação de DOCs, registro de CDBs e títulos de Renda Fixa.
Essa fusão posicionou a B3 mais ainda no controle do mercado financeiro brasileiro, centralizando a responsabilidade por mais transações e auxiliando no atendimento de praticamente todas as instituições financeiras do Brasil em uma única firma de capital aberto. Os impactos disso parecem ser positivos até o momento, com uma série de inovações acontecendo ativamente.
Conclusão
A história do mercado de capitais brasileiro ainda é muito recente, com a maturidade econômica da população acompanhando a sua evolução ao longo dos anos. Ao longo das décadas vimos diversos críticos a bolsas de valores centralizadas, como é o caso da B3, mas os impactos de sua atuação no Brasil parecem ser positivos.
Anteriormente, investir em ações e ativos de renda variável era inacessível para a maioria dos brasileiros, com custos de transações altos, e uma lógica extremamente difícil de compreender sem um bom background técnico. Consequentemente, apenas a parcela mais rica da população tinha a capacidade financeira e técnica para investir e participar do mercado de ações, um dos muitos fatores que contribuem para a concentração de renda.
Entretanto, com a digitalização dos processos, a unificação das bolsas estaduais e a centralização do mercado em uma única entidade, hoje é possível para qualquer cidadão realizar transações de forma mais fácil, acessível e extremamente barata (com muitas corretoras de valores que disponibilizam, inclusive, taxas gratuitas de corretagem para os usuários).
Por esse motivo, pode-se considerar que a história da B3 é a história do mercado de capitais brasileiros. Não somente ela protagoniza o mercado atualmente, mas também foi a protagonista das principais mudanças ocorridas nesse cenário desde a década de 1890.